27 de outubro de 2005

Uma cruz no quadrado

Ando preocupado com o futuro do meu país. A razão ( uma só!) é simples: no começo de 2006 vou ter de escolher o "meu presidente"!
Como se vê, o motivo da minha preocupação resume-se a uma cruz desenhada sem grandes cuidados estéticos no interior de um pequeno quadrado; o que importa é que indique o meu eleito, a minha preferência, o mais capaz, o mais erudito, o mais...o mais tudo! Para mim, claro....
Mas é este "mais tudo" que me dá cabo do miolo...
Vejamos: um é alto, gordo, gasto, usado, mas tem o saber de um velho soba e, se fosse tempo de monarquia instituida, talvez fosse "rei"; outro tem barba a necessitar de estilista barbeiro, é menos usado, menos gasto, e não se lhe adivinham gostos monárquicos - pelo contrário! Dá-se como escritor, mas cá para mim é, simplesmente, o poeta com quem gostaria de me parecer na qualidade e na forma da escrita, e não como pessoa, porque por aí ganho-lhe aos pontos: a minha barba tem cuidados de tesoura bem afiada e não esconde a barbela!
Há ainda outro, de discurso gasto, usado, nada gordo, e também não lhe noto requintes de príncipe, rei ... ou presidente.
O candidato que mais me faz recuar uns anitos nas lembranças é o último da lista: os gestos de "anarquista" são um pouco de mim nos tenros anos; também aprecio a elegância resultante de alguma dieta menos conservadora e não desdenho ouvir os seus recados enérgicos, atentos e venerados por plateia irreverente, sobretudo quando o actor vem à boca do proscénio dizer de si coisas, monólogos, com continuação na "página seguinte".
Perante estes cenários, a minha intrínseca preocupação começa a ser um tabu, que irei desvendar no dia em que desenhar esteticamente a cruz no quadrado das minhas dúvidas....
Hummm... esqueci-me da minha maior preocupação!...
...Dizem que está mais simpático, será?

25 de outubro de 2005

Viagem com regresso marcado


... Ontem as andorinhas do meu bairro voaram baixo, em grupos, chilreios mais audiveis. Olhei-as do sexto andar e, por breves segundos, segui a evolução do voo: iam e vinham num corrupio alucinante sobre os beirados...
... Afinal, as andorinhas do meu bairro estavam a "despedir-se" dos seus lares... A viagem que encetavam tem regresso marcado. Talvez em março próximo.
Virão todas?
Voltarei a vê-las da minha varanda?

24 de outubro de 2005

Em cantos...

Em cantos canto a tristeza que sobre mim se abate;
em cantos canto a alegria que recordo com saudade...
em cantos vivo o dia a dia pensando,
correndo suavemente pelos canteiros do destino.
...
Parto sem saber para onde vou, e volto sem saber por que parti,
sempre na imensidão do silêncio absurdo e acusador que me rodeia e aperta...
...
Em cantos me fecho e tapo, me lamento e debato,
sonhando realidades mais confusas que utopias,
sonhos mais duros que a realidade impossivel que me rodeia.
Em cantos grito a dor que sinto,
grito o silêncio que doi e flameja no meu peito...
Em cantos vivo,
em cantos sofro e escorrego pelo meu próprio pensar.
Denise ("noite de poesias "/ RiTuAL -00/02/11)

SECRETO SEGREDO

Viajei com as minhas mãos pelo oceano de lágrimas do teu rosto
em busca de porto seguro
- miragem de emoções
cativas da memória do olhar que se perdeu
na imensidão do teu sorriso,
que sempre fala, mas pouco diz;
por isso, há uma jura de não te ver
e um desejo para que voltes
todos os dias...
Fico à espera
das palavras que não ouvi, do carinho que não recebi,
do acto que não senti - do gesto de um beijo!
Ah... mas se eu soubesse
que outras mãos percorriam o teu corpo
em busca de sensações adormecidas,
talvez a paixão ganhasse asas
e voasse,
como num sonho,
rumo à solidão a que me proponho!
Este secreto segredo
é muito mais do que estar só!...

23 de outubro de 2005

FERNANDO VALLE -"O Mestre que (me) ensinou a arte de sonhar"

"O que desejo deixar expresso... é o facto de a determinante de toda a minha vida ter sido o lutar pela libertação do homem, no sentido de se conseguir, efectivamente, um regime de direito em que seja possível, de facto, a paz, a liberdade e a justiça social"
Fernando Valle, 1977

21 de outubro de 2005

AMBANINI!


Polémica latente que baila perante o meu olhar, melancólico e ausente,
eclodiu com violência de desesperar.
Polémica visível entre entes como eu, de
olhares frios e vazios,
mas de vontades férreas como a que me prendeu;
por isso, deixei que o tempo corresse - separei o trigo do joio e fiquei quedo e mudo a escutar a voz da adolescência numa linguagem que não entendo:

- Choaneeeeeeeeeeee - entoam as marimbas!
- Buialéne!
Não respondo ao cumprimento nem ao apelo do passado...
Agora, este cajado a que me apoio, pau tortuoso e sem medida,
verga coitado ao peso desta desdita ...
Sem ele,percorri o tempo de lés a lés,
fui autodidacta,"procurei a verdade ",
e deixei que me negassem outros mundos preciosos
- desfez-se o sonho da esperança...
Perante esta polémica que baila em sorrisos hipócritas, horas,dias,semanas,meses e anos a fio,
fiquei
...vazio.

20 de outubro de 2005

...Era uma vez...


AINDA O "MESTRE" ROBY AMORIM, COM SAUDADE!
(no tempo do "telex")

Tempo de guerra

(ilustração: Roby Amorim)
*
Passos... ruído...
e tudo num repente se transforma:
as sombras são homens
e a noite faz-se dia - é o céu que se ilumina
com o ribombar dos clarões;
eles caminham,
correm, caem, vêm aos trambolhões!
Eis que as trevas se desvanecem
e "eles" aparecem!!!
...
Aqui um ruído,
além um grito,
um corpo que cai
sem um gemido
sem um ai!
Vila Cabral/68 -BC 20

Eu,"deus"






Equiparei-me a um deus
desprovido de omnipotência
na ânsia de ser igual a mim mesmo...
____
Ilustração: aguarela de Roby Amorim (77) - redacção do jornal "telex"
(singela homenagem ao "mestre")

Fim de festa

Queria ver-te nua
e da alma despida
na rua,
perdida...
Em gozos celestiais,
êxtases de loucuras
e orgias de entontecer,
banais seriam as tuas graças
- desventuras talvez!
E eu, rosto enxuto,
braços cruzados,
a ver morrer aos poucos,
de vez,
a alma, o corpo
a tua imagem,
sem coragem
de oscular em fim de festa
o pouco que de ti resta....
ca.'.