17 de março de 2014

HUC: tratamento " VIP"





Perdi a conta aos anos que me separam de uma certa noite de sábado, que podia ter sido a última entre o número dos vivos.
Sem saber como, no RiTuAL Bar, caí atrás do balcão. O que aconteceu a seguir pertence ao mundo  do "não me lembro", mas tenho presente que "acordei" com  a voz mansa do João Paiva:
- Alguma quebra de tensão, não há-de ser nada , mas é melhor ir ao Centro de Saúde...
O Paiva continuou gentil, sugeriu que o seguisse  até à sua viatura e lá fomos...
Passava das dez da noite, havia imensa gente  à espera de consulta, mas  como "ameacei"  com novo desmaio, levaram-me  quase ao colo  à presença do doutor Herdade. Desse momento até ser encaminhado para uma ambulância de "teto alto", a pedido do médico, passaram-se poucos minutos...
A caminho dos HUC,  sob a proteção de um enfermeiro, aconteceram outras peripécias que recordo vagamente . Quando "acordei" estava rodeado de médicos e enfermeiros, e a minha filha  Ana Rita  com cara de caso, mas sorriu quando  trocámos olhares.
Durante quatro dias fui tão  bem tratado,  que me considerei "um VIP" !
Na verdade, TODOS os doentes  da cardiologia  eram bem tratados...
Volvidos não sei quantos anos, continuo a "sentir-me VIP" quando vou aos HUC para os exames de rotina.
Não tenho pressa em passar ao "Oriente Eterno", por isso acertei o passo com  meia dúzia de comprimidos e cá vou indo, nem sempre muito ajuizado quando a ementa  anuncia   cozido à portuguesa e outras comidinhas leves...
Hoje, segunda feira, a meio da tarde, recebi um telefonema dos HUC. O cavalheiro com quem falei tratou-me  como se  eu fosse "VIP", lembrando-me que os meus registos sobre o colestrol não estavam atualizados e que seria melhor  fazer análises.
- Olhe que não, amigo, disse eu - sempre que vou aí,  levo uma catrefa de exames,  colestrol incluído. Ainda a semana passada "cumpri todos os rituais" e   a doutora Ana Rita  achou que estava tudo dentro dos parâmetros...
- Ah,  como as  análises não são feitas aqui nos HUC, respondeu, não temos os seus registos atualizados. Ainda bem que é cuidadoso; sendo assim, não vale a pena   duplicarmos os exames. Continuação de boa saúde, senhor Carlos...
- Muito obrigado, disse, e acrescentei:
- Registo o gesto com muito agrado, sobretudo agora, quando tanto se diz dos serviços hospitalares; " meio a brincar", digo-lhe que me sinto  "um VIP" com a sua gentileza...
E deixei  meia gargalhada no ar, "feliz da vida" !
Então, até Novembro...

2 de março de 2014

"Palavrões"

Há dias assim, feitos de leituras antigas. 
Esta croniqueta vem de Junho de 2009.
Na passada semana voltei aos HUC, lembrei-me deste texto e  notei "melhorias  nos meus conhecimentos técnicos": drogas como    Rosuvastantina, Ezetimiba, Perindopril  permitem-me "acordar vivo". Se continuar com "juízo",em novembro volto aos cuidados da  doutora Ana Rita Ferreira...

Seis horas no hospital à espera de uma consulta, são horas a mais, mas não havia volta a dar-lhe, e quem espera, desespera. Por vezes, quem espera tem um “bónus”, o meu foi uma consulta.
O médico que me recebe é simpático e deve ser muito competente; não apresento queixas, mesmo assim entendeu que o colesterol precisava de uma ajudinha para vir por aí abaixo na escala dos valores que considera ideais para quem tem problemas cardíacos, como é o meu caso. Vai daí, alterou-me a medicação e foi explicando, tintim por tintim, como serão úteis as diversas substâncias que compõem os novos comprimidos, possivelmente minúsculos, como eram os anteriores.
Fixo a posologia, mas quando percorreu caminhos enviesados para o meu entendimento, limito-me a ouvi-lo pronunciar “palavrões” do estilo: Rosuvastantina, Ezetimiba, Perindopril…! Continuo “sem fala”, mas se pergunta “Percebeu?”, quer que lhe responda com um sim, não, ou talvez, e eu sorrio, que é a melhor das respostas quando se é leigo no assunto. Acho que todos nós, os doentes, e mesmo aqueles que o não são, devemos responder sempre ao médico com um sorriso. O doutor não se obriga a grandes explicações, se dissermos “Não, não percebi patavina”, e se dissermos “Sim, senhor doutor, percebi”, ele sabe que estamos a mentir, mas ficamos por ali mesmo, pela nossa ignorância. Portanto, sorrir em tons de amarelo é uma boa resposta (se fosse verde, era sinal de que tínhamos percebido; vermelho, seria o mesmo que dizer “Troque isso por miúdos e numa linguagem que se perceba”).
Um sorriso, como se vê, é a salvação de quem está perante alguém que sabe mais do que nós sobre qualquer coisa, a não ser que estejamos numa sala de aula, onde o mestre tem por missão ensinar; aos alunos, só resta estar atento à matéria, nada de assim-assim no entendimento, como sucedeu há dias, durante uma lição sobre gestão da floresta, que dá sempre jeito a profissionais e a ignorantes (como eu!). Quando a engenheira Tânia falou da Pseudotsuga – um “palavrão” que em alguns casos assume grande porte, se o associarmos a uma espécie de “pinheiro” de jardim – fiquei a saber que é uma mentira apontar a resinosa como familiar do Pinus pinaster, o “nosso” pinheiro bravo”. Tem pinhas, sim senhor, mas isso não lhe confere qualquer parentesco!
Seis horas numa sala de espera, dão para imensa coisa: ler o jornal, partes de um livro, ouvir as conversas dos vizinhos, ou passear o olhar pelos rostos de quem está por ali… à espera. Aproveitei o tempo consoante o cansaço que proporciona a incómoda cadeira; se me concentrava na leitura, de quando em vez, ficava em alvoroço com uma voz de mulher que vinha do altifalante. Era timbrada, e os decibéis, acima da média para o local, preenchiam “violentamente” o espaço.
Ao meu lado, uma senhora, entrada na idade, “ passava pelas brasas”. Tantas vezes se sentiu incomodada com as chamadas, do estilo “António Francisco Simões, sala cinco” (aquilo era rápido, questão de segundos!), entre tremores e um ressonar “simpático”, a dado momento, talvez por estar a meio de um sonho bonito, deu um salto na cadeira e soltou um sonoro desabafo:
-“Ai credo, porra que me assustei”!
Nessa altura estava eu preso à leitura das últimas sobre o “meu” Benfica, depois de ter mergulhado numa crónica do Miguel Esteves Cardoso.
-“Carlos Alberto Ramos, gabinete dois” – chegou a minha vez!
Eram três da tarde.