"Há dias assim, com pormenores de gentileza e sorrisos a condizer"
O passaroco (mocho?) em relevo, pousado num galho, faz parte dos cartazes estrategicamente colocados na sala de espera e junto ao guichet das consultas de cardiologia, nos HUC (Hospitais da Universidade de Coimbra).
A legenda (do cartaz) “Espere em silêncio…tranquilamente”, não pode ser considerada uma ordem, nem anuncia espera longa, apenas sugere tranquilidade e boca calada.
Quem tem alguma maleita cardiovascular, deve procurar estar calmo, por isso, a sugestão é uma espécie de placebo bem aceite, creio, pela maioria dos utentes.
Naquele segunda-feira, a funcionária, ao “postigo”, quando fazia a minha inscrição, não foi de modas no aviso: o “meu” médico deixara de dar consultas e o substituto, como estava doente, não vinha naquele dia! Tinha duas soluções: ou regressava a casa e marcava atendimento para outro dia, longe no tempo, ou esperava e era recebido por outro médico depois ter passado em revista os “seus” doentes. Decidi esperar, “mas olhe que vai demorar bastante tempo a ser atendido”, disse a funcionária; “o que quer dizer com bastante tempo”?, perguntei – “umas horas”, respondeu com ar resignado.
Se tinha de ser assim, paciência, decidi-me pela espera em silêncio, tranquilamente…
Nos trezentos minutos, bem contados, que se seguiram, li todos os jornais que estavam espalhados pelas cadeiras, sempre de boca calada e com a tranquilidade que a situação exigia; depois, desci tranquilamente pela escadaria interior até ao rés-do-chão e fiquei quieto num sofá por tempo “infinito”.
Não faço ideia de quantos “malucos”, como eu, ocupavam o seu tempo de espera naquela pose contemplativa tradicional: pernas cruzadas, braços sobre os joelhos e o olhar atento a quem passava.
As pessoas, na sua maioria, traziam o passo acelerado, sinal de que estavam com pressa de chegar a algum sítio. Jovens licenciados, de bata branca e estetoscópio sobre o pescoço, cruzavam-se com gente humilde no trajar, um pouco perdida na confusão de quem conhece os cantos à casa; os delegados de informação médica faziam realçar a sua condição de mensageiros, elegantes nos fatos, de pastas recheadas de publicidade numa das mãos; seguranças e oficiais dos serviços de limpeza cuidavam das suas missões com esmero…
No enorme átrio da entrada principal não há cartazes a sugerir silêncio e tranquilidade; mesmo assim as conversas eram calmas e (aparentemente) tranquilas.
Cansado do entretêm a que me tinha proposto, subi ao terceiro piso.
“Ainda é cedo”, disse a funcionária que se preparava para terminar o dia de trabalho. Continuei a espera em curtos passeios pelo corredor…
Por volta das 5 da tarde – finalmente! – abriu-se a porta de um dos gabinetes, saiu de lá um sujeito com ar satisfeito, uma voz feminina chamou pelo meu nome e eu, ao entrar, disse “ boa tarde”, talvez com cara sisuda, daí que o sorriso da jovem médica, que acompanhou a retribuição do cumprimento, me tivesse devolvido a tranquilidade que, confesso, já era pouca….
Depois, vieram as (inesperadas) palavras que pacificaram por completo a minha consciência: “peço desculpa por ter esperado tanto tempo…”.
Perante atitudes de educação e respeito deste quilate, para que conste, não podia deixar de trazer a Doutora Elisabete à ribalta desta despretensiosa croniqueta.
Há dias assim, com pormenores de gentileza e sorrisos a condizer…
O passaroco (mocho?) em relevo, pousado num galho, faz parte dos cartazes estrategicamente colocados na sala de espera e junto ao guichet das consultas de cardiologia, nos HUC (Hospitais da Universidade de Coimbra).
A legenda (do cartaz) “Espere em silêncio…tranquilamente”, não pode ser considerada uma ordem, nem anuncia espera longa, apenas sugere tranquilidade e boca calada.
Quem tem alguma maleita cardiovascular, deve procurar estar calmo, por isso, a sugestão é uma espécie de placebo bem aceite, creio, pela maioria dos utentes.
Naquele segunda-feira, a funcionária, ao “postigo”, quando fazia a minha inscrição, não foi de modas no aviso: o “meu” médico deixara de dar consultas e o substituto, como estava doente, não vinha naquele dia! Tinha duas soluções: ou regressava a casa e marcava atendimento para outro dia, longe no tempo, ou esperava e era recebido por outro médico depois ter passado em revista os “seus” doentes. Decidi esperar, “mas olhe que vai demorar bastante tempo a ser atendido”, disse a funcionária; “o que quer dizer com bastante tempo”?, perguntei – “umas horas”, respondeu com ar resignado.
Se tinha de ser assim, paciência, decidi-me pela espera em silêncio, tranquilamente…
Nos trezentos minutos, bem contados, que se seguiram, li todos os jornais que estavam espalhados pelas cadeiras, sempre de boca calada e com a tranquilidade que a situação exigia; depois, desci tranquilamente pela escadaria interior até ao rés-do-chão e fiquei quieto num sofá por tempo “infinito”.
Não faço ideia de quantos “malucos”, como eu, ocupavam o seu tempo de espera naquela pose contemplativa tradicional: pernas cruzadas, braços sobre os joelhos e o olhar atento a quem passava.
As pessoas, na sua maioria, traziam o passo acelerado, sinal de que estavam com pressa de chegar a algum sítio. Jovens licenciados, de bata branca e estetoscópio sobre o pescoço, cruzavam-se com gente humilde no trajar, um pouco perdida na confusão de quem conhece os cantos à casa; os delegados de informação médica faziam realçar a sua condição de mensageiros, elegantes nos fatos, de pastas recheadas de publicidade numa das mãos; seguranças e oficiais dos serviços de limpeza cuidavam das suas missões com esmero…
No enorme átrio da entrada principal não há cartazes a sugerir silêncio e tranquilidade; mesmo assim as conversas eram calmas e (aparentemente) tranquilas.
Cansado do entretêm a que me tinha proposto, subi ao terceiro piso.
“Ainda é cedo”, disse a funcionária que se preparava para terminar o dia de trabalho. Continuei a espera em curtos passeios pelo corredor…
Por volta das 5 da tarde – finalmente! – abriu-se a porta de um dos gabinetes, saiu de lá um sujeito com ar satisfeito, uma voz feminina chamou pelo meu nome e eu, ao entrar, disse “ boa tarde”, talvez com cara sisuda, daí que o sorriso da jovem médica, que acompanhou a retribuição do cumprimento, me tivesse devolvido a tranquilidade que, confesso, já era pouca….
Depois, vieram as (inesperadas) palavras que pacificaram por completo a minha consciência: “peço desculpa por ter esperado tanto tempo…”.
Perante atitudes de educação e respeito deste quilate, para que conste, não podia deixar de trazer a Doutora Elisabete à ribalta desta despretensiosa croniqueta.
Há dias assim, com pormenores de gentileza e sorrisos a condizer…
Caro amigo,
ResponderEliminarMuitos parabéns por esta sua magnífica crónica onde relata com grande precisão, o seu longo dia de espera por uma consulta, nos HUC.
Deve ser uma pessoa especial, muito paciente, muito correcto.
Penso que, se todos tivéssemos uma atitude, assim, perante os obstáculos com que somos confrontados no nosso dia a dia, a vida seria muito mais fácil e as relações humanas seriam muito mais cordiais.
Bem-haja por esta lição de vida.
Um abraço de amizade.